segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

Diário de bordo alagoano: Eu também sou Dragqueen

Por Mariana Kaoos

Noite em Maceió, 28 graus de calor, cerveja e verão no bairro do Jaraguá, centro da cidade dotado de construções antigas, bares de esquina e, surpreendentemente nessa noite, um tapete vermelho. Absorvida na curiosidade alheia seria muita pretensão acreditar que o tapete seria em homenagem a minha despedida da capital alagoana. Como se já não bastasse a recepção no aeroporto com a faixa “bem vinda minha rainha!”, ir embora sendo coroada seria demais até para mim.

Pela primeira vez nas Alagoas, eu, baiana rebuceteira, atordoada na esquina ao som de Gloria Gaynor, esperando o ônibus passar para ver de perto o que estava acontecendo, me encantei ao perceber meio que como em filmes hollywoodianos, descendo do taxi de salto agulha, lingerie rosa de bolinhas brancas e batom vermelho, daqueles “diamantes”, a mais linda das lindas da noite. Louca, gritando, vem em minha direção e me pede para segurar seu celular de capinha de pelica, se dizendo atrasada. Conhecida por todos através do seu nome de guerra, Penélope Pink, ela comenta que foi ao bairro para prestigiar a inauguração do primeiro “Dragchó” da cidade, ou seja, um brechó com roupas e fantasias voltadas para as dragqueens. “Eu acho ótimo que Maceió conte a partir de agora com um brechó voltado exclusivamente para o nosso universo porque são roupas que serão usadas no carnaval, na parada gay e nas nossas apresentações em boites e festas. Hoje, direcionando o meu trabalho apenas para as boites, faço cover de grandes divas como Britney Spears, Rihanna, Katty Perry, dentre outras. Comprando novos modelitos a um preço menor só tenho a brilhar cada vez mais em minhas apresentações”.










Chegando de mansinho de vestido colorido e gravador rosa (homenagem inconsciente ao evento? rs) presenciei com um sorriso no rosto as apresentações de dragqueens já conhecidas em Maceió, como Melyna Star Rios e Ashilley Halley. Em meio a muito “bate cabelos”, plumas, brilhos e paetês, as meninas brilharam na passarela, arrancando gritos eufóricos do público que estava prestigiando o evento. De peruca loura e espartilho colado no corpo, a caricata e dragqueen há dois anos e quatro meses, Lavínia Beauty, contou em meio a risos e rebolados o porquê desses nomes de guerra. “Nós nos apresentamos com nomes femininos, ou os nomes de guerra porque é uma nova identidade que assumimos. Desde a época da escola, os meninos me chamavam de Lavínia e acabou pegando. Já o Beauty vem da primeira pessoa que me montou, ou seja, da minha mãe dragqueen. Geralmente toda drag tem uma mãe e alguns acabam carregando o sobrenome delas”.




A idéia do “dragchó” veio da linda, montadíssima e soberana Pântala Butterfly que junto com sua amiga Lavínia Burtner e seu marido Tiago Umbelino colocaram em pratica o projeto tão sonhado. “Como eu trabalho há oito anos com eventos e tenho muitos figurinos toda época de carnaval e parada LGBT eu fazia um brechó para as pessoas se produzirem e comprarem as coisas mais baratas, porque roupas assim são caríssimas por conta do brilho e do glamour. Então, agora que abri uma empresa, finalmente consegui alugar esse espaço e inaugurar um brechó de fantasias, que é coisa rara no Brasil todo”. Quando indagada a respeito da homofobia que assola todo o país principalmente em relação à cultura das dragqueens, Pântala, para minha surpresa e orgulho, afirmou que “ser drag hoje em dia não é ser um viadinho. Considero o termo dragqueen como referente a um profissional artístico que anima eventos, o que é muito diferente daquelas pessoas que andam fechando nas ruas, se depravando, muitas vezes se prostituindo, enfim, não se respeitando. Enquanto nós da classe não nos respeitarmos ninguém vai. A educação e o combate a homofobia tem que começar de dentro pra fora”.

Finalizando o desfile e como quem faz rituais para boa sorte num novo momento, a fita vermelha do Dragchó foi cortada. Grande aglomeração na porta, jornalistas locais cobrindo os detalhes da noite, pessoas brindando com cerveja em copo plástico e eu, me perdendo e me encontrando no meio daquela gente, lembrando de uma frase da Penélope Pink, logo no início da noite em que ela diz que “ser dragqueen é homenagear as mulheres. E toda drag vem de uma grande mulher”. Eu, também dragqueen, agradecendo baixinho a todas aquelas que me transformaram no que sou e dançando junto com todas elas “I will survive” encerrei a noite sorrindo e querendo urgente procurar aulas de “bate cabelo”.

O Rebucetê indica:



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